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As Férias no Algarve antes de 1974

Antes da Revolução dos Cravos de 25 de abril de 1974, as férias no Algarve eram consideradas um luxo e estavam reservadas apenas a alguns. No tempo da ditadura o turismo não era acessível como o conhecemos nos dias de hoje, sendo que as viagens eram dispendiosas e os acessos quase inexistentes ou de difícil passagem para quem desejasse chegar ao sul de Portugal. O turismo não era o sector principal do Algarve que, nessa altura, dedicava-se principalmente à pesca e ao pomar do sequeiro das amêndoas e figos. Descubra como eram as férias no Algarve antes de 1974 e fique a conhecer a realidade da região em tempo de ditadura.

 

O turismo antes de 1974 era regulado pelo Estado Novo, que limitava o acesso aos locais turísticos e apenas permitia conhecer aspetos mais regionalistas, quando a realidade destes, era suavizada. O turismo não tinha o desenvolvimento como o conhecemos hoje e só a partir de 1963, quando foram iniciadas as grandes construções de alguns hotéis junto à orla marítima do Algarve e com vista para a praia, a atividade começou a ter mais afluência. António de Oliveira Salazar, então presidente do Conselho de Ministros, apoiou e incentivou os turistas nacionais e estrangeiros a conhecer a região. Embora possamos considerar que o grande desenvolvimento turístico tenha tido início depois da construção de algumas unidades hoteleiras, o grande “boom” foi depois da inauguração do aeroporto de Faro, a 11 julho de 1965.

Numa primeira fase, os estrangeiros que visitavam o Algarve, eram maioritariamente ingleses, que chegavam em aviões fretados. Não era pela inexistência de alguma procura pela região antes da construção do aeroporto, mas os transferes de Lisboa ao sul demoravam muito tempo a chegar e passavam por estradas com fracas condições.

Um dos destinos prediletos dos ingleses era a Praia da Luz e ainda hoje podemos afirmar que é um recanto que, não só os ingleses, mas outras nacionalidades vindas da Europa e de outros pontos do mundo, também procuram. A par da Praia da Luz, estava Lagos e Monte Gordo como os destinos mais visitados durante a primeira vaga de turistas estrangeiros ao Algarve.

Este foi o ponto de partida para os próprios portugueses começarem a ver a região com outros olhos e planearem as suas férias com destino ao Algarve. No entanto, nem sempre as férias foram um direito dos trabalhadores deste país. Antes, o período mais aguardado do ano, não era pago e só tirava uns dias para descanso, quem tivesse algum poder económico para o fazer. A lei do direito às férias existe desde 1937 em Portugal, mas até 1974 era rara a pessoa que usufruía deste direito. No máximo, um trabalhador tinha o direito a usufruir de 8 dias de descanso por ano, depois de 5 longos anos de “bom e efetivo serviço”.

 

Conhece outras leis portuguesas que hoje não fariam sentido? Deixamos aqui algumas que antes de 1974 se encontravam em vigor em Portugal:

  • Proibição de viajar para o estrangeiro sem autorização do marido – Em 1966 saiu a lei de que qualquer mulher não poderia sair do país, quer fosse para trabalhar ou em lazer, sem a autorização do marido. Sem essa autorização, não lhes era facultado o passaporte para prosseguir viagem até ao estrangeiro. Esta lei esteve em vigor até 1969.

 

  • Era proibido ler certos livros – o conhecimento era extraído de livros e muitos iam contra os ideais do Estado Novo. Os livros permitiam às pessoas ganhar consciência e como em qualquer ditadura, essa era a porta de entrada para uma revolução, portanto, muitos livros foram proibidos. O autor com mais livros banidos pelo Estado Novo, foi José Vilhena, que misturava humor com sátira política e assim teve 29 obras banidas das livrarias portuguesas.

 

  • As mulheres estavam proibidas de usar biquíni na praia – Apesar da Segunda Guerra Mundial, as mulheres eram livres na Europa e tinham hábitos que em Portugal não eram permitidos. Com a chegada de refugiados, Portugal começou a ter contacto com o mundo exterior, bem como, com os seus hábitos. O Estado Novo, decidiu então implementar regras na roupa de banho que só poderia ser usada em locais onde se pudesse praticar natação. As mulheres eram obrigadas a usar um saiote com o comprimento de 1 centímetro abaixo do calção de banho e as costas tinham de estar tapadas até 10 centímetros acima da cintura. Os homens também tinham de seguir regras na escolha da indumentária de banho, mas calhava mais às mulheres as revistas com fita métrica na entrada das praias.

 

  • Era proibido beber Coca-Cola – Beber Coca-Cola era muito mais que beber um refrigerante qualquer, era um estilo de vida trazido da América e para Salazar, isso significava problemas. A bebida gasificada tentou entrar no mercado português nos anos 20 e até teve direito a um slogan escrito por Fernando Pessoa, “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”. No entanto, a marca não saiu vitoriosa e só conseguiu entrar em Portugal três anos depois da Revolução dos Cravos.

 

 

  • Proibido usar isqueiro sem licença – Durante o Estado Novo existiam os fiscais dos fósforos ou até a polícia que fiscalizava as licenças de quem tivesse isqueiro na sua posse. A razão da existência desta regra era simples: tinha como finalidade incentivar a indústria dos fósforos em Portugal. Por essa razão, quem preferisse um isqueiro, teria de pagar uma licença que custava 60 escudos (30 cêntimos, atualmente) e se não tivesse a licença consigo teria de pagar uma multa de 250 escudos (1,5 €). Aos denunciantes era dada uma percentagem de 15% da multa pelo “infrator”.

 

  • Não havia liberdade de expressão – As opiniões, em especial sobre o Governo, não podiam ser ditas em voz alta e qualquer ideia contrária ao Estado Novo, mesmo que escrita, passava sempre pelo “lápis azul” da censura. Muitas obras como livros, músicas, quadros ou desenhos e notícias não passavam para o público em geral, por colocar a ordem pública em perigo. Também os ajuntamentos de pessoas eram proibidos, muito menos associações ou reuniões.

 

Já conhecida a realidade de Portugal durante a ditadura? Consegue imaginar passar férias no Algarve antes de 1974 com algumas das proibições que mencionamos aqui? Faça esse exercício e agradeça a existência da Revolução dos Cravos a 25 de abril de 1974. Portugal, hoje, é livre!